Viver e morrer, lidando com o luto: Superar não é esquecer, é aceitar e continuar a viver – Coluna Nilberto Antônio

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Prezado leitor!

Em um texto publicado anteriormente (Qual sentido da vida? Você tem se questionado sobre isso) questionei sobre o sentido da vida. Hoje irei discutir um pouco, sobre o que para muitos é o oposto a vida, à morte e o processo de luto. A morte é um processo ‘natural’ que está presente na vida de todos nós, para alguns mais cedo, para outros, de modo mais trágico, e para os privilegiados, de forma a corresponder com os grandes ciclos naturais da vida. Embora parte da vida, a morte é vista em nossa sociedade como algo a ser evitado, postergado, como se morrer fosse adversário do processo de viver.

Essa visão se baseia em três princípios. Primeiramente, quando se está na vida, é preciso encontrar forças para lutar por ela e a morte elimina qualquer possibilidade de continuidade dentro da mesma perspectiva de antes. Pode-se falar, é claro, da continuidade espiritual, da prevalência das memórias que mantêm viva uma pessoa que se foi. Mas o fato é que a morte interrompe um processo, modificando as possibilidades e os rumos dos envolvidos. Por isso, a batalha entre pulsão de vida e pulsão de morte, coloca muitas vezes as duas em extremidades opostas, apesar da morte estar contida na vida e esta naquela.

O segundo ponto que nos faz temer a morte é o que vem depois dela. De todas as transformações, a morte é a mais definitiva e profunda. Se há vida depois da morte… eis uma questão de foro íntimo, uma questão de fé e de percepção de vida. Da perspectiva da Terra, pura e simples, o que há na morte é a saudade e o encerramento de uma história. Se esse encerramento é uma passagem para um mundo diferente do nosso, nem todos conseguem se agarrar a essa esperança.

O último elemento que nos faz ter repulsa à ideia da morte é a dor. Em qualquer língua, em qualquer época, em qualquer história, dor é dor, e requer muito treino, paciência e aceitação para se tornar construtiva em nossa trajetória. A dor é uma violência para a alma e nos tira do patamar de compreensão que tínhamos até então para nos lançar ao estado do limbo, no qual não se pertence a mundo nenhum, pois a conexão com a realidade fica frágil.

Quando se perde alguém violentamente, de modo repentino ou inesperado, quem fica permanece nesse limbo por um tempo indeterminado. É comum pessoas em processo de luto serem tomadas por um estado de tristeza profunda, sem vontades. Uma parte continua vivendo, pois entende ser necessário, mas a outra não está lá. A alma fica dividida e constantemente, o enlutado sente que morreu também e que sua história nunca mais será a mesma. De fato, nunca mais será, pois a morte marca a alma. Entretanto, estamos na vida para sermos transformados a partir das experiências que o acaso (será?) nos propõe. A superação só se dá a partir de um longo processo e ela não significa esquecer, fingir que não aconteceu ou ainda não sentir dor quando lembrar. Superar significa apenas aceitar e continuar.

Mas como aceitar algo que não faz sentido? Algo que não vem com avisos, que não parece ter um por quê dentro da lógica do merecimento? Como aceitar a morte de alguém bom, que tinha uma vida enorme pela frente? E que o destino levou em segundos, sem nos ter orientado para aquele momento? Como continuar sem ter mais vontade de viver, sem ter um sentido que nos norteie?

Conforme a estudiosa Elizabeth Kluber-Ross, autora de vários livros sobre o tema, diante do luto pela perda de alguém qualquer ser humano passa por cinco estágios: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Esses estágios não necessariamente são subsequentes, podendo estar misturados e serem vividos ao mesmo tempo.

Negar é não poder ver e usar recursos para afastar a realidade que dói. Entre esses recursos temos uma infinidade de ações: acreditar que o morto ainda voltará, manter todos os objetos dele intactos, como se o esperasse voltar, ou ainda negar a dor da situação, indo se divertir de modo desproporcional ao que o momento pediria, ou entregando-se a algum vício.

Ter raiva é querer culpar alguém. É procurar um responsável pela dor, é pensar que poderia ter sido diferente se o fulano não tivesse errado nisso, se o médico tivesse tentado aquilo, se a pessoa que ficou tivesse chegado minutos antes… A raiva não permite encarar o processo como algo que fugiu do controle, ela é necessária para descarregar, mas é um esforço quase vão que nos liga ao passado.

Barganhar é tentar negociar com o destino. Fazer promessa, magia. Esses recursos são importantes, mas ainda demonstram uma ligação com um passado que não se quer deixar ir.

A depressão é o último estágio antes da aceitação e não é por acaso. Quem se deprime está mais perto de ver as coisas como elas são e compreender o que a morte causou. O perigo desse estágio é o tempo de permanência, pois longos períodos de permanência podem causar sérios impactos vida do sujeito.

Finalmente, a aceitação é o processo que nos torna capazes de ver, tocar, falar sobre a morte e ao mesmo tempo, deixá-la ir para onde tiver que ir, longe de nossos domínios, de nosso controle racional. Deixar ir não significa esquecer, tampouco não sofrer nunca mais. Deixar ir é fazer as pazes com o tempo, com novas chances para quem ficou, com a única certeza de que absolutamente tudo muda e que é preciso se transformar junto com a vida e com a morte.

Nilberto Antônio

Nilberto Antônio Gonçalves, psicólogo clínico com ênfase em atendimento de crianças especiais. Trabalha com Orientação Profissional. Psicólogo do Projeto Responsabilidade na Infância e Adolescência – RIA do Centro Social Mali Martin. Atua voluntariamente na Associação Amar e Renascer – Aamar (Instituição para tratamento de dependentes químicos) de Itamarandiba.

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